As hipóteses que autorizam o juiz da causa a transformar uma recuperação judicial em falência, previstas no artigo 73 da Lei 11.101/2005, são taxativas e devem ser interpretadas restritivamente. Dessa maneira, o magistrado não pode abrir a interpretação na aplicação dessa medida.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a um recurso especial que buscava evitar a decretação de falência de uma empresa que admitiu ao juiz ter dificuldades para cumprir o plano de recuperação aprovado pelos credores.
A votação foi unânime, com base na posição do relator, ministro Marco Aurélio Bellizze. O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva classificou a decisão como importante por reforçar o caráter taxativo do artigo 73 da lei, que trata das hipóteses de decretação de falência. “Evita alguma possível interferência judicial indevida e delimita o campo de atuação”, elogiou ele.
Em crise financeira, a empresa pediu a recuperação judicial em 2007 e teve o plano homologado em 2010. Em 2015, avisou o juiz que não conseguiria fazer o pagamento das obrigações previstas. Por isso, solicitou a convocação da assembleia-geral de credores, para aprovar um novo plano, o que foi negado.
Em 2016, o magistrado transformou a recuperação judicial em falência. A decretação se deu com base no artigo 73, inciso IV, da Lei 11.101/2005, por “descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação”, na forma do que prevê o artigo 61, parágrafo 1º.
Essa norma, por sua vez, diz que o juiz pode manter a empresa em recuperação judicial até que sejam cumpridas todas as obrigações previstas no plano que vencerem até, no máximo, dois anos depois da concessão. O descumprimento de qualquer uma delas acarretará a transformação da recuperação em falência.
Para decretar a falência, o juiz sustentou que a empresa já estava em recuperação judicial havia nove anos, período no qual não conseguiu se reerguer financeiramente. Em vez disso, admitiu que não cumpriria o plano ao pedir uma nova assembleia-geral de credores.
No entanto, o ministro Bellizze entendeu que não houve no caso o real descumprimento das obrigações do plano de recuperação judicial. Por isso, a decretação da falência se deu de forma indevida, com base em uma conjectura.
“Não cabe ao juízo da recuperação, nesse contexto, antecipar-se no decreto falimentar, antevendo uma possível (mas incerta) inexecução das obrigações constantes do plano, a pretexto de incidência do artigo 61, parágrafo 1º, e, por conseguinte, do artigo 73, IV, ambos da Lei 11.101/2005, sem que efetivamente tenha ocorrido o descumprimento.”
Para ele, o juiz deu indevida ampliação extensiva a uma norma que, por impor uma sanção grave como a falência, deve ter interpretação restritiva.
Com base no artigo 63 da Lei 11.101/2005, o juiz deveria ter simplesmente encerrado a recuperação judicial da empresa. Como nos autos não há notícia sobre o descumprimento ou não das obrigações do plano, a 3ª Turma preferiu devolver o caso para análise de provas e fatos pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
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REsp 1.707.468
Fonte: ConJur