A acusação de que teria sido obrigada a cumprir jornada extenuante, sem intervalo para almoço e sem poder deixar a empresa nesse horário, sofrendo coações e humilhações, tudo em condições que se assemelhariam a de trabalho escravo, rendeu a uma vendedora da região sudeste de Mato Grosso a condenação de pagar dano moral a seu ex-empregador.
A decisão foi proferida em reconvenção proposta pelo ex-patrão, na reclamação trabalhista movida pela vendedora. A reconvenção é um de ação por meio do qual o réu, ao mesmo tempo em que apresenta sua defesa, acusa o autor do processo.
O caso, julgado na Vara do Trabalho de Alto Araguaia, envolveu pedidos da trabalhadora referentes a nove anos de prestação de serviço para a mesma família: inicialmente como empregada doméstica, depois como auxiliar de limpeza na loja de material de construção de propriedade do genitor e, por fim, como vendedora do estabelecimento.
Na ação, a trabalhadora requereu a condenação do ex-empregador ao pagamento de horas extras, feriados trabalhados e diferenças salariais. Pediu também compensação por danos morais, alegando ter trabalhado sob coação, em jornada extenuante colocando em risco sua saúde e sua vida, sem intervalo para refeição, em um contexto que, afirmou, assemelhava-se a trabalho análogo ao de escravo.
Entretanto não conseguiu provar nenhuma das alegações relacionadas ao dano moral. Além disso, confessou, em audiência, nunca ter sido humilhada pelos ex-patrões, e que “eles queriam que as ordens emanadas fossem cumpridas, mas que não haviam ordens abusivas”, sentindo-se ‘desconfortável’ no ambiente de trabalho por não ter autonomia para dar descontos aos clientes, o que a levava a perder vendas.
Da mesma forma, não comprovou a jornada extenuante (de mais de 12 horas diárias conforme afirmou ao dar entrada no processo).
Direitos da Personalidade
O caso resultou, no entanto, na condenação da trabalhadora a pagar 3 mil reais a seu ex-empregador. Em reconvenção, ele pediu o ressarcimento pelos danos decorrentes das acusações que recaíram sobre seu bom nome e imagem, construídos ao longo de uma década de funcionamento na região.
Ao analisar o pedido, a juíza Karina Rigato, titular da Vara do Trabalho de Alto Araguaia, lembrou que não apenas as pessoas naturais contam com proteção a seus direitos personalíssimos como também as pessoas jurídicas, conforme estabelece o Código Civil em seu artigo 52. “E um desses direitos da personalidade afetos à pessoa jurídica é justamente a honra objetiva, ou seja, seu direito de imagem e bom nome comercial perante a sociedade, os quais, acaso maculados, gera à pessoa jurídica danos morais a serem compensados, não se olvidando ainda que a possibilidade da pessoa jurídica vir a sofrer danos morais já é matéria assente na jurisprudência, tendo sido inclusive sumulada pelo STJ por meio do verbete nº 227: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”, explicou.
A magistrada destacou, ainda, que a trabalhadora, devidamente assistida por advogado, acusou o empregador de escravizar, ameaçar e coagir “não podendo agora, após serem afastadas tais acusações levianas e irresponsáveis, capazes de macular a imagem e nome do empreendimento comercial, notadamente numa pequena cidade alegar tratarem-se de ‘simples direito de ação’ haja vista que, numa situação análoga, acaso a ré levantasse graves acusações como essas, a exemplo de uma acusação furto cominando em justa causa resolutória, e não comprovasse, certamente incorreria em ato ilícito por violação aos direitos personalíssimos da autora, vindo fatalmente a ser condenada ao pagamento de compensação por danos morais”.
Desta forma, concluiu que a autora da ação cometeu ato ilícito violando direito de imagem e ao nome do empregador e, assim, condenou-a a arcar com a compensação pelos danos morais causados, valor que será deduzido do montante que ela receberá em razão de diferenças de verbas rescisórias reconhecidas na sentença.
PJe 0000470-69.2017.5.23.0131
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